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Chris Marker: Carta da Sibéria por André Bazin

Chris Marker (1): Carta da Sibéria por André Bazin

tradução livre;

fonte: Chris Marker (1): https://cinefilobar.wordpress.com/2012/07/30/chris-marker-1-lettre-de-siberie-por-andre-bazin/


Chris Marker (1): Carta da Sibéria por André Bazin

Acordamos esta manhã com a triste notícia da morte de Chris Marker (1921 – 2012). Assim escreveu Bazin sobre ele há mais de 50 anos: “Existe um denominador comum em toda essa exibição de recursos: a inteligência”.

Chris Marker Carta da Sibéria

por André Bazin

Chris Marker é, talvez seja lembrado, o autor dos textos de Bibliothèque Nationale [Biblioteca Nacional] e Les Statues meurent aussi [As estátuas também morrem] (que o público só pôde ver até agora parcialmente, pois foi cortado pela censura). Esses textos incisivos, contundentes, nos quais uma afiada ironia brinca de esconde-esconde com a poesia, seriam suficientes para conferir ao seu autor um lugar de destaque na produção de curtas-metragens, o setor mais vibrante do cinema francês. Como autor dos textos dos filmes de seu amigo Resnais, com quem se entende maravilhosamente bem, Chris Marker já havia renovado profundamente a relação habitual entre texto e imagem. Mas sua ambição era claramente mais radical: ele pretendia realizar seus próprios filmes.

Primeiro foi Dimanche à Pekín [Domingo em Pequim], justamente premiado no Festival de Tours de 1956, e agora é a extraordinária Lettre de Sibérie [Carta da Sibéria]. Dimanche à Pekín era sem dúvida admirável, embora ao mesmo tempo um pouco decepcionante, já que o formato do curta-metragem parecia insuficiente para um tema tão amplo. Também deve-se reconhecer que as imagens, muitas vezes muito belas, no entanto, não forneciam material documental suficiente. Deixavam-nos querendo mais. O germe da dialética entre imagem e palavra, que Chris Marker iria desenvolver em Lettre de Sibérie, já estava presente. Uma dialética que desta vez se desdobra com a duração de um longa-metragem e com todas as suas consequências.

“Um ponto de vista documentado”

Como apresentar Lettre de Sibérie? Primeiramente pelo que não é, constatando que não se assemelha a nenhum filme de tipo (de “tema”) documental que até agora vimos. Mas agora precisamos tentar dizer o que é. Objetiva e simplesmente, este filme é a reportagem cinematográfica de um francês que tem o privilégio de visitar a Sibéria com total liberdade, seguindo um itinerário de vários milhares de quilômetros. Embora já tenhamos visto, há três anos, alguns relatórios filmados por viajantes franceses na Rússia, Lettre de Sibérie não se parece com nenhum deles. Para tentar captar de forma mais precisa sua natureza, proponho esta definição aproximada: Lettre de Sibérie é um ensaio em forma de reportagem cinematográfica sobre a realidade siberiana do passado e do presente. Ou ainda melhor, adaptando a fórmula que Vigo aplicava a À propos de Nice [A Propósito de Nice], “um ponto de vista documentado”, direi que é um ensaio documentado pelo filme. A palavra que importa aqui é “ensaio”, entendida no mesmo sentido que na literatura: um ensaio ao mesmo tempo histórico e político, embora escrito por um poeta.

De fato, geralmente, mesmo no caso do documentário “comprometido” ou de tese, a imagem, ou seja, o elemento propriamente cinematográfico, constitui a matéria-prima do filme. A orientação é dada pela seleção e montagem, e o texto finaliza a organização do sentido conferido ao documento. No caso de Chris Marker, ocorre algo diferente. Diria que a matéria-prima é a inteligência, a palavra sua expressão imediata, e que a imagem só intervém em terceira posição, em relação à inteligência verbal. O processo foi invertido. Arriscarei ainda outra metáfora: Chris Marker tr

az em seus filmes um conceito completamente novo de montagem, que eu chamaria de horizontal, em oposição à montagem tradicional que ocorre ao longo do filme, centrada na relação entre os planos. No caso de Marker, a imagem não remete ao que a precede ou sucede, mas de certa forma está totalmente relacionada ao que é dito.

Do ouvido ao olho

Melhor ainda, o elemento primordial é a beleza sonora, e é dela que a mente deve saltar para a imagem. A montagem é feita do ouvido ao olho. Devido à falta de espaço, darei apenas um exemplo disso, aliás, o mais bem-sucedido. Chris Marker nos apresenta um documento significativo e ao mesmo tempo bastante neutro: uma rua de Yakoutsk. Vemos passar por ela um ônibus e alguns trabalhadores consertando o pavimento; por último, um homem de aparência um tanto sinistra, em todo caso não favorecido pela natureza, passa casualmente em frente à câmera. Chris Marker decide então comentar essas imagens, bastante anódinas, de dois pontos de vista opostos: primeiro, o do simpatizante comunista, após o qual o pedestre desconhecido aparece como um “pitoresco representante das regiões boreais”; o pedestre, na versão reacionária, se transforma em “um inquietante asiático”.

Esta antítese, por si só, já pode ser considerada uma descoberta brilhante e digna de regozijo, embora também possa parecer um truque fácil; então, o autor nos propõe um terceiro comentário, imparcial e detalhado, que descreve objetivamente o pobre mongol como “um iacuto que sofre de estrabismo”. Nesta ocasião, estamos além da astúcia e da ironia, pois o que Marker acaba de fazer é fornecer uma demonstração implícita de que a objetividade é ainda mais falsa do que os dois pontos de vista sectários, isto é, que, pelo menos no que diz respeito a certas realidades, a imparcialidade é uma ilusão. A operação a que assistimos é precisamente dialética, pois consistiu em emitir três iluminações intelectuais distintas sobre uma mesma imagem e em receber seu eco.

Inteligência e talento

Ainda me resta informar ao leitor, para completar a ideia que se pode fazer desta empresa sem precedentes, que Chris Marker não se limita a usar documentários filmados in loco, mas emprega todo o material fílmico útil ao seu objetivo: e não apenas, naturalmente, documentos de caráter estático (gravuras, fotos, etc.), mas também desenhos animados, sem hesitar, aliás, em dizer, à maneira de McLaren, as coisas mais sérias de modo mais cômico (como na sequência dos mamutes). Há apenas um denominador comum a todo este desdobramento de recursos: a inteligência. A inteligência e o talento. É justo mencionar que a fotografia é de Sacha Vierny, a música de Pierre Barbaud, e que o texto é excelentemente dito por Georges Rouquier.

Ao lado de Lettre de Sibérie, é projetado um extraordinário documentário de Mario Ruspoli sobre a caça à baleia cachalote, tal como ainda é praticada hoje em dia em algumas ilhas dos Açores, ou seja, com a técnica arcaica do arpão manual, a mesma descrita por Melville em Moby Dick. É tanto um documentário sobre a caça às baleias quanto um filme etnográfico sobre a vida desses estranhos povos pescadores.

(France-Observateur, 30 de outubro de 1958 e Le cinéma français de la libération à la nouvelle vague, Cahiers du Cinéma, 1998)


Esta tradução foi extraída de Chris Marker: Retorno à inmemoria do cineasta, volume editado com motivo da exposição e programação audiovisual que com o título Chris Marker teve lugar na Fundação Antoni Tàpies, Barcelona (4 de dezembro de 1998-24 de janeiro de 1999) e no Centro Andaluz de Arte Contemporânea, Sevilla (4 de março – 4 de abril de 1999). Valencia, Ediciones de La Mirada, 2000.

fonte: https://cinefilobar.wordpress.com/2012/07/30/chris-marker-1-lettre-de-siberie-por-andre-bazin/

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